Antes das “Fake News”: O Caso dos Protocolos e da Guerra dos Mundos
Antes da revolução digital, um dos casos mais notórios de influência política através da disseminação de informações falsas é o da publicação intitulada “Os protocolos dos sábios de Sião”.
Nos dias 16, 17 e 18 de Agosto de 1921 o jornal londrino “The Times” publicou uma matéria investigativa sobre um documento que circulava na Europa desde os primeiros anos do século XX e que sugeria um complô Judeu para a dominação do mundo. A matéria evidencia que o documento havia sido forjado e partes dele plagiado de outras obras sem conexão com sua motivação. Lançado na Rússia em 1903, o panfleto se espalhou pela Europa em vários idiomas e chegou a ser impresso nos Estados Unidos pelo jornal de Henry Ford em 1920. Além de ser um exemplo clássico de documentação anti-semita, potencializando o racismo como motivação política, alguns pesquisadores apontam sua influência na promoção da ideologia Nazista na Alemanha na década de 30 e 40, colaborando assim com a tragédia da II Guerra Mundial. Mesmo após a comprovação da farsa, ainda hoje há quem considere o documento verdadeiro, inclusive líderes políticos de viés anti-semita, que dão ao texto uma legitimidade há muito desmentida.
Outro caso ocorreu em 30 de Outubro de 1938, quando o ator e cineasta Orson Welles narrou um trecho da obra “A guerra do mundos”, do escritor H. G. Wells, pelo rádio. O narrador comentara que a ideia da adaptação radiofônica do livro tinha a intenção de simular os eventos enquanto eles se desenvolviam, como se fosse um boletim ao vivo ou uma notícia. O estilo realista da interpretação gerou irrupções sociais documentadas em alguns locais dos Estados Unidos. A polícia compareceu ao estúdio e relatos de distúrbios, pânico e estresse foram coletados e atribuídos a junção da audiência do programa com a tensão social pré segunda guerra. Há mesmo quem afirme que esta reação ao programa foi também um mito. O ambiente disruptivo, no entanto, foi propagado, e há registros de que o próprio Adolf Hitler teria ligado esta suposta reação ao programa de rádio à “evidência da decadência e condição corrupta da democracia”.
Estes exemplos atestam a capacidade que as mídias de massa tinham de interferir tanto na psicologia social quanto na ideologia política das sociedades de seus tempos. Mesmo antes do fenômeno digital, a circulação massiva das informações era parte do desafio das sociedades democráticas e um elemento central de seu destino real.