Dado o uso estratégico do termo “notícias falsas” por agentes estatais e autoridades públicas para caracterizar qualquer tipo de crítica de opositores ou da imprensa em seu papel legítimo de fiscalizadora, proibições genéricas de disseminação de notícias falsas não são consideradas compatíveis com os padrões internacionais de direitos humanos. Como lembra a Declaração Conjunta dos relatores especiais, restrições a liberdade de expressão só se justificam se (i) forem previstas em lei, (ii) atendam a um interesse reconhecido na legislação internacional e (iii) sejam necessárias e proporcionais à proteção deste interesse. Elas também podem ser impostas para proibir a incitação à violência, discriminação e hostilidade.
A proibição ou criminalização genérica da publicação de conteúdos falsos, conforme proposta em alguns dos projetos de lei sobre o tema que tramitam no Brasil, pode dar margem para a censura de conteúdos opinativos, matérias investigativas e diversos outros tipos de manifestações legítimas. Além disso, pode permitir a vigilância e perseguição de grupos políticos, ativistas de direitos humanos, jornalistas, comunicadores populares ou comunitários, blogueiros e usuários comuns de Internet. Pelos mesmos motivos leis de difamação criminal também são consideradas excessivamente restritivas e deveriam ser abolidas em favor de regras civis.
Devem ser implementadas medidas para proteger indivíduos da responsabilização pelo engajamento com conteúdos dos quais não são autores e que não modificaram nas redes sociais. Do mesmo modo, a responsabilização dos intermediários da Internet só deve ocorrer se houver intervenção no conteúdo ou se eles se recusarem a obedecer uma ordem judicial legítima para a retirada de conteúdos.
Restringir a circulação de informações nos diversos meios de comunicação, inclusive on-line, favorece a desinformação. Isso não significa que não deva haver nenhum tipo de responsabilização pela difusão de desinformação. De acordo com a Declaração Conjunta sobre Liberdade de Expressão, Desinformação e Propaganda, os agentes públicos não devem realizar, apoiar, promover ou difundir declarações que saibam ou deveriam razoavelmente saber serem falsas ou que não sejam baseadas em evidências verificáveis. Em conformidade com as obrigações legais nacionais e internacionais e com suas obrigações públicas, eles devem procurar difundir informações confiáveis, inclusive sobre questões de interesse público como economia, saúde pública, segurança e meio ambiente.