A desinformação é ela própria uma forma de ataque a comunicadores quando estes se tornam objeto de informações falsas e boatos com o objetivo de ofendê-los e depreciá-los. A situação é motivada seja pelo incômodo com uma reportagem ou com opiniões e análises feita pelo profissional nas mídias.

Dois casos do período eleitoral ilustram bem o procedimento: as histórias criadas sobre Leonardo Sakamoto, diretor da ONG repórter Brasil, e Miriam Leitão, jornalista do grupo Globo.

Sakamoto é alvo constante de ataques, tendo sofrido agressões e ameaças de morte seguidas vezes por seu trabalho. Neste caso, porém, um boato foi atribuído ao jornalista no contexto da colaboração das agências de checagem de fatos com o Facebook.

Além de figurar no dossiê de checadores como um dos mentores intelectuais dos ditos censores, circularam nas redes sociais textos e comentários mencionando Sakamoto como gestor das agências de checagem e como alguém que teria sido pessoalmente contratado pelo Facebook para o trabalho de checagem de notícias.

A veiculação pulverizada dessas informações falsa serviu de pretexto para novas ofensas e ameaças, como relatou o jornalista em seu blog num texto em que desmente as acusações.

O caso de Miriam Leitão envolve outra forma de se produzir desinformação. Uma foto da jornalista passou a circular também nas redes sociais e WhatsApp acompanhada de uma mensagem falsa, que atribui a ela participação num assalto a mão armada a um banco em 1968.

A foto é verdadeira, sendo da ocasião em que a jornalista foi presa por razões políticas em 1972, mas sua associação ao evento do assalto a banco é falsa, conforme checagem do portal G1 em seu projeto “Fato ou Fake”. Outros veículos voltados a desmentir informações inverídicas, como o portal boatos.org também analisaram a publicação, mostrando que ela segue diversos traços das notícias falsas: “vaga, alarmista e sem citar fontes confiáveis.

Vale notar como a produção de mentiras sobre comunicadores segue o roteiro dos ataques online. A informação falsa é o primeiro evento de uma sequência. Ela em si já se constitui uma forma de difamação e descredibilização de alguém, mas sua circulação nas redes estimula reações de leitores, que passam às ofensas (e,eventualmente, ameaças) públicas e privadas aos comunicadores.

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A produção de desinformação está em constante transformação, possuindo estratégias e formas diversas. Recentemente tem-se observado a proliferação de perfis falsos nas redes sociais imitando veículos tradicionais ou mesmo comunicadores. Apresentando-se como sátiras e paródias, muitos desses perfis apresentam diferenças mínimas em relação às pessoas ou instituições que mimetizam. Dentre os recursos textuais usados em redes como o Twitter, por exemplo, está a inserção do emoji que representa um ciclone ao lado do nome do usuário, imitando o símbolo usado pela plataforma para identificar uma conta verificada, ou seja, aquela em que está confirmada a autenticidade de um usuário, veículo, ou instituição.

Com os casos trazidos aqui, procuramos mostrar que produção, circulação recepção e investigação da desinformação envolvem não apenas ataques aos fatos,  mas também a comunicadores. Por um lado, investigar e combater a desinformação motivou ataques contra jornalistas; por outro, a desinformação é também usada como forma de atingi-los.  Se o ambiente online é palco principal destas violações, suas causas, formas de ocorrência e consequências não podem ser negligenciadas e precisam ser compreendidas.

Além da possibilidade que ameaças de violência e morte efetivamente se concretizem, a perturbação psicológica, imposição de medo e perseguição pessoal produzidas pelos ataques já são tentativas concretas de silenciamento. O ambiente online propicia que comunicadores estejam diante de uma comunidade de espectadores, leitores e ouvintes sem mediações. Se isso cria novos  canais de interação e de produção e troca comunicativa entre comunicadores e público, também aumenta a exposição pública dessas pessoas e sua vulnerabilidade.

Outro traço marcantes das investidas diversas contra comunicadores é a tentativa de minar a credibilidade do trabalho jornalístico. Em nome de preferências pessoais, violadores sufocam critérios que orientam estas produções – como o respeito aos fatos e a presença do contraditório – para justificar um combate à imprensa. Compreender esse mecanismo e suas motivações é tarefa das mais atuais, pois a partir dele uma questão se coloca: como então justificar a relevância do jornalismo e se contrapor a sua descredibilização?